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Como reduzir o recolhimento do Pis e da Cofins a partir dos descontos condicionados (financeiros)
Os descontos condicionados (ou financeiros) dependem de um evento futuro e incerto, de um fato posterior à emissão da nota fiscal. Exemplo clássico é o desconto concedido se o cliente efetuar o pagamento antecipado da nota (se pagar até o dia 05, desconto de 10%).
Os descontos financeiros estão associados ao cumprimento de determinada condição (futura e incerta), vinculada ao prazo de pagamento, quantidade adquirida etc. Tais eventos poderão ou não ocorrer, a critério do cliente.
Já os descontos incondicionados são aqueles oferecidos no momento da compra.
A emissão da nota fiscal já ocorre com o desconto registrado. Esses são previstos legalmente como passíveis de exclusão da base de cálculo do PIS e da Cofins (e
do ICMS e do IPI).
Vale mencionar, ainda, a bonificação, que consiste na entrega, por parte do fornecedor, de uma quantidade maior de produto vendido, em vez da concessão de uma redução do valor da venda. Assim, o preço médio de cada produto é reduzido — já que o vendedor aumenta a quantidade — sem causar redução do preço do negócio.
As bonificações concedidas em mercadorias configuram descontos incondicionais, podendo ser excluídas da receita bruta de venda, para efeito de apuração da base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep, mas apenas quando constarem da própria nota fiscal de venda dos bens e não dependerem de evento posterior à emissão desse documento, conforme já reconheceu a Receita Federal em diversas Soluções de Consulta, dentre elas a Solução de Consulta Cosit nº 313, de 15 de dezembro de 2023.
Os descontos financeiros, regra geral, – ainda que ocorra o evento futuro e incerto
que o configure –, por lei, não podem ser excluídos da base de cálculo das contribuições.
Note-se, todavia, que, em 11/04/2023, a 1ª. Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), entendeu que os descontos condicionados (ou financeiros) devem ser excluídos da base de cálculo do PIS e da COFINS. De ver-se, no entanto, que foi feita a seguinte ressalva: tal exclusão só se aplica ao contribuinte adquirente das mercadorias, e não ao fornecedor que concede o desconto.
A lógica adotada pela Relatora do caso, Ministra Regina Helena Costa, foi no sentido de que, para o varejista (comprador), independente do desconto recebido, o montante nunca representará uma receita, pois quem compra algo sempre incorre em custos.
A 1ª. Turma, portanto, foi favorável aos varejistas, o que permite a propositura de ação judicial que vise excluir tais descontos da base de cálculo do PIS e da Cofins e, assim, reduzir a carga tributária de referidas contribuições.
Em que pese referido julgado e os argumentos apresentados, em sessão de 05.12.2023, a 2ª Turma do STJ, no julgamento do Recurso Especial nº 2.090.134/RS, adotou entendimento diametralmente oposto, aduzindo que os descontos condicionados representam, em verdade, retribuição devida pelo fornecedor ao varejista decorrente do tratamento favorecido dado aos produtos adquiridos. Nos termos do Acórdão:
“V – Na hipótese, os ‘descontos’ e as bonificações, embora possam repercutir no preço ao consumidor, são as retribuições devidas aos varejistas pelos fornecedores, em virtude das medidas destinadas à ampliação de vendas dos seus produtos (propaganda e promoções, por exemplo) e do posicionamento e tratamento privilegiado nas gôndolas e nos estabelecimentos (aluguel de espaço e verbas para promotores de vendas, por exemplo).
VI – Os descontos e as bonificações representam a remuneração pela fruição da estrutura disponibilizada pelos varejistas; e, portanto, devem ser incluídos na base de cálculo da contribuição ao PIS e da Cofins, por constituírem receita bruta, na forma do inciso IV do art. 12 do Decreto-Lei n. 1.598, de 1977. Não por outro motivo tais valores deixaram de ser destacados nas notas fiscais das mercadorias”. (grifou-se)
O caso analisado pela 2ª Turma do STJ envolveu descontos condicionados recebidos tanto em dinheiro, como por meio de compensação contábil entre fornecedor e varejista e, também, por meio de dação em pagamento e bonificações. Assim, como os descontos constituíram “formas de adimplemento das obrigações”, a Corte Superior entendeu pela incidência do PIS e da COFINS.
Apesar da forma de concessão do desconto não ter sido objeto de análise no REsp
1.836.082/SE* da 1ª. Turma que foi favorável aos varejistas, há evidente divergência de entendimento entre as Turmas do STJ no que se refere à própria tributação dos descontos condicionados, o que, além de trazer insegurança jurídica aos contribuintes do ramo varejista, a nosso ver, impede a exclusão das verbas de rede da base de cálculo do Pis e da Cofins sem decisão judicial favorável específica para o contribuinte.
Ou seja, enquanto o entendimento discordante das turmas do STJ não for uniformizado na Corte – seja por meio de embargos de divergência ou por meio do julgamento de Recursos Repetitivos, que envolvem ambas as turmas no deslinde do tema –, apenas os descontos incondicionados e bonificações, devidamente registrados em nota fiscal, podem ser excluídos da base de cálculo do PIS e da COFINS, sem o ajuizamento de ação própria.
Caso os descontos não acompanhem os documentos fiscais, ou sejam contabilmente compensados com outros débitos existentes junto ao fornecedor, é necessário o ajuizamento de medida judicial que garanta a exclusão dos descontos condicionados da base de cálculo do PIS e da COFINS, evitando-se assim a aplicação de multas por descumprimento da legislação tributária.
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* Ementa do julgado:
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 1.022 DO CPC/2015. INOCORRÊNCIA. ARTS. 1º, CAPUT, § 3º, V, A, DAS LEIS NS. 10.637/2002 E 10.883/2003. BASE DE CÁLCULO DA CONTRIBUIÇÃO AO PIS E DA COFINS. INGRESSO PATRIMONIAL NOVO. AQUISIÇÃO DE PRODUTOS POR VAREJISTA COM DESCONTO CONCEDIDO POR FORNECEDORES.
PARCELA REDUTORA DO CUSTO QUE NÃO CARACTERIZA RECEITA DO COMPRADOR.
CONTRAPARTIDA DO ADQUIRENTE PARA OBTENÇÃO DO ABATIMENTO NÃO CONSTITUI
PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E PROVIDO.
I – Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. In casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015.
II – O tribunal de origem apreciou todas as questões relevantes apresentadas com fundamentos suficientes, mediante apreciação da disciplina normativa e cotejo ao posicionamento jurisprudencial aplicável à hipótese. Não existência de omissão, contradição ou obscuridade.
III – Consoante previsto nos arts. 1º, § 3º, V, a, das Leis ns. 10.637/2002 e 10.883/2003, a base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS, no regime não cumulativo, consiste no total de receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil, razão pela qual o conceito jurídico de receita não se vincula àquele veiculado pela ciência das finanças. Precedente do STF.
IV – Nas relações comerciais entre agentes econômicos, o adquirente de mercadorias para revenda despende valores com a compra de produtos para desempenho de sua atividade empresarial, sendo desinfluente a natureza jurídica dos descontos obtidos do fornecedor para a incidência das contribuições em exame quanto ao varejista, porquanto rubrica modificadora da receita de quem vende e redutora dos custos do comprador.
V – A pactuação de contrapartida a cargo do revendedor para a redução da quantia paga ao fornecedor constitui forma de composição do preço acordado na transação mercantil, motivo pelo qual não pode ser dissociada desse contexto para figurar, autonomamente, como a contraprestação por um serviço.
VI – Os descontos concedidos pelo fornecedor ao varejista, mesmo quando condicionados a
contraprestações vinculadas à operação de compra e venda, não constituem parcelas aptas a possibilitar a incidência da contribuição ao PIS e da COFINS a cargo do adquirente.
VII – Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido.
(REsp n. 1.836.082/SE, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 11/4/2023, DJe de 12/5/2023.)
Luiza Brandelli
Sócia fundadora do escritório Brandelli e Campelo Advogados Associados, Mestre em Direito Empresarial pela Universidade de Barcelona/ES, Pós-graduada em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários, atua nas área do Direito Empresarial, Tributário e Societário.