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Terceirização de mão-de-obra, o que aprendemos com o caso exposto sobre “Trabalho análogo à escravidão”?
Uma notícia chocou o país na 4ª feira, 22 de fevereiro. A Polícia Rodoviária Federal (PRF) resgatou cerca de 200 pessoas trabalhando em situação análoga à escravidão no Sul do País.
Segundo os policiais, os trabalhadores “foram flagrados em condições degradantes”.
A operação da PRF ocorreu após denúncia de três funcionários de uma empresa terceirizada que prestavam serviços para outras grandes empresas.
Além dos constantes atrasos de pagamento, os trabalhadores eram submetidos a longas jornadas de trabalho, alimentação inadequada, coação para permanecerem na empresa e até mesmo violência física.
As grandes empresas citadas, que mantinham contrato com a empresa terceirizada, se manifestaram publicamente repudiando qualquer ato de violação dos direitos humanos e trabalhos sob condições precárias.
Segundo uma das grande empresas, embora a empresa “tenha atendido às exigências legais na contratação do fornecedor, reconhecemos o erro em não averiguarmos in loco as condições de moradia oferecidas por este prestador de serviço aos seus trabalhadores.
Trata-se de um incidente isolado na trajetória centenária da empresa, e já estamos tomando as medidas cabíveis frente ao tema, com toda a seriedade e respeito que a situação exige.
A empresa trabalhará prontamente não apenas para coibir novos acontecimentos, mas também para promover a conscientização das melhores práticas sociais e trabalhistas em parceria com órgãos e entidades do setor”.
Em sua nota, uma das empresas menciona que “no período sazonal, como a safra da uva, a empresa contrata trabalhadores terceirizados, devido à escassez de mão-de-obra na região”.
E complementa afirmando que todo e qualquer prestador de serviço recebe alimentação de qualidade durante o turno de trabalho, como café da manhã, almoço e janta.
Todos os prestadores de serviço recebem treinamentos previstos na legislação trabalhista e não há distinção de tratamento entre os funcionários da empresa e trabalhadores contratados.
“A empresa reforça que exige das empresas contratadas toda documentação prevista na legislação trabalhista”.
Outra empresa mencionou que “desconhecia a situação relatada” e ainda informou que “… o contrato era de prestação de serviço de descarregamento dos caminhões e seguia todas as exigências contidas na legislação vigente.”
Apesar das empresas terem se coloco à disposição para apoio aos trabalhadores terceirizados, isso não redime suas responsabilidades, bem como futuras consequências penais.
Isso ocorreu com a Votoratim em 2021 quando teve de assumir a responsabilidade sobre prejuízos causados a trabalhadores de uma construtora terceirizada.
O Sintecomp propôs uma ação em nome de 48 ex-empregados da terceira.
“A pretensão era o pagamento de salários atrasados e horas extras pelo longo tempo de viagem de ônibus percorrido pelos funcionários até a fábrica”.
O sindicato exigia que a Votorantim arcasse com todos os débitos na falta de quitação pela construtora.
O Tribunal Regional do Trabalho (TRT-23) acatou o pleito da Sintecomp apontando que “a terceirização traz como consequência, mesmo quando praticada de forma plenamente lícita e válida, quer na atividade meio, quer na atividade-fim da empresa, que o tomador dos serviços responde de forma subsidiária em relação às obrigações trabalhistas inadimplidas pelo prestador”.
O que podemos aprender com esses casos?
Primeiramente é importante destacar que no Brasil recentemente foi homologada uma nova lei de Terceirização.
A Lei nº 12.439/2017 estabelece todas as condições para a terceirização de mão-de-obra.
Cabe ao profissional de Compras, responsável pela seleção de fornecedores, assegurar que as empresa convidadas para participar do processo de concorrência estão integralmente obedientes a essa legislação.
Para garantir essa aderência, o Comprador deve junto ao departamento Jurídico da sua empresa, identificar quais documentos os fornecedores deverão apresentar previamente.
Apenas depois da devida avaliação e aprovação documental, os fornecedores serão convidados para participar da licitação.
Contudo, em muitos casos essa análise não é suficiente. Visitas aos potenciais fornecedores são fundamentais para a comprovação das condições de saúde e segurança dos colaboradores.
Nessas visitas é importante que participem o solicitante do serviço, bem como os departamentos de SSMA e Qualidade de ambas as empresas (Contratante e Contratada).
Registros fotográficos deverão ser feitos para evidenciar a situação atual. Caso não seja permitido, os participantes tomar notas de quaisquer desvios, pois serão base para negociação, aprovação ou reprovação do fornecedor.
Mesmo que algumas irregularidades de baixa relevância sejam observadas durante a visita, na hipótese de uma futura contratação, a empresa contratante deverá exigir as devidas correções.
Outra forma de mitigação de risco é a inclusão de SLA (Service Level Agreement – Acordo de Nível de Serviço, em português) no contrato de terceirização. SLA é um acordo entre as partes que visa garantir que o fornecedor atuará de acordo com a expectativa da Contratante.
Ao longo da execução do serviço, caberá à Contratada apresentar registros que comprovem o cumprimento de requisitos fundamentais para a continuidade do contrato.
A falta, atraso ou falha nessas comprovações poderão acarretar paralisação no serviço, multas ou quebra do contrato.
O diligenciamento é uma outra ação eficaz para garantir a execução do contrato em conformidade com as exigências legais e com as condições negociadas.
A terceirização exige que a Contratante se certifique que o fornecedor está cumprindo todos os critérios estabelecidos no contrato.
Por isso é tão relevante a alocação de um recurso para essa função, pois ao fiscalizar um contrato prontamente, a Contratante tem a oportunidade de observar riscos antecipadamente, prevenir acidentes, desvios de qualidade e de custos.
Muitas vezes a falta de acompanhamento na execução do contrato, coloca em risco não somente a qualidade do serviço terceirizado, mas a imagem da empresa no mercado consumidor.
Em caso de má conduta da empresa terceirizada, a Contratante poderá ter sua reputação deteriorada com seus clientes, e em consequência, queda de vendas, receita, lucro, desvalorização de suas ações, entre outros impactos imensuráveis.
Não podemos esquecer que além do prejuízo financeiro que também pode trazer uma terceirização mal contratada ou administrada, isso gear impacto direto nos índices de ESG (Environmental, Social and Governance, em português: Ambiental, Social e Governança).
Nos dias de hoje, a agenda ESG é responsável direta pelo valor da empresa junto a investidores e clientes.
Dar a devida atenção para o ESG é demonstrar que a empresa está comprometida com iniciativas no que diz respeito à coletividade, e isso inclui o cuidado não somente com seus colaboradores, mas também dos seus terceirizados.
Espero que esse artigo possa trazer luz para as suas próximas contratações e que você, Comprador, seja um agente de mudanças na sua empresa.
Conte comigo nessa jornada!
Executivo de Supply Chain com especialização em projetos de Petróleo e Gás, projeto em MBA de Gestão de Suprimentos, Logística e Supply Chain e Mentor de Carreira para Profissionais de Compras.